Número 80 Ano 99 2020

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O NÚMERO 80

Rogério Faria Tavares

Fundada em 1909, em Juiz de Fora, para promover a literatura e a língua portuguesa, a Academia Mineira de Letras transferiu-se para Belo Horizonte em 1915, mas foi no final dos anos 40 que conquistou sua primeira sede própria, no centro da capital, quando o seu presidente era Heli Menegale. Em 1987, passou a funcionar num autêntico museu-casa, o Palacete Borges da Costa, à mítica Rua da Bahia, graças à persistência de seu tenaz timoneiro, Vivaldi Moreira. Sete anos depois, ficou pronto o edifício anexo, projetado pelo arquiteto Gustavo Penna e dotado do espaço adequado para abrigar sua intensa programação de cursos, seminários e palestras, as exposições de arte e os lançamentos de livros. Ativa e incansável, hoje a Academia não se limita à sua estrutura física. Tem site na internet, está no Facebook, no Instagram…

Detentora de um acervo bibliográfico e documental de mais de 30 mil itens, aberto à consulta pública e gerido de acordo com os melhores padrões, a chamada Casa de Alphonsus de Guimaraens guarda as coleções de Carlos Soares de Moura, Edison Moreira, Eduardo Borges da Costa, Eduardo Frieiro, José Guimarães Alves, Milton Campos, Nelson de Sena, Onofre de Freitas e Vivaldi Moreira, além de sua famosa Drummondiana, um conjunto de 400 textos datilografados e anotados à caneta pelo poeta de Itabira. Na Biblioteca dos Acadêmicos, é possível conferir toda a vasta produção gerada por patronos e fundadores e pelos sucessivos ocupantes de suas 40 cadeiras.

Lugar de sociabilidade, a Academia é o território da convivência suave, fraterna e elegante, amparada pela mais fina filosofia humanista. Inspirada por valores como o pleno respeito pela diversidade e pela livre expressão do pensamento, em tudo contrária ao preconceito, à discriminação e ao elitismo, a instituição consagrou-se, ao longo do tempo, por reunir os mais expressivos prosadores, poetas, professores, filósofos, médicos, cientistas e estadistas mineiros, erguendo poderosa reputação de apreço pelo rico repertório cultural de nossa gente.

Prova inconteste de seu entusiasmo pelas coisas de Minas é dada, desde 1922, pela publicação de sua Revista, um dos periódicos mais antigos do estado até hoje em ampla circulação, por décadas somente em papel e agora, também, em sua versão digital, disponível, sem custos, na rede mundial de computadores. Leais ao sonho de seus primeiros editores, como Mário de Lima, o presidente que a concebeu, suas páginas continuam atentas e sensíveis às mais variadas manifestações do fenômeno literário, sem restrições de nenhuma natureza, cientes de que ele não emerge, na contemporaneidade, apenas na universidade ou nos extratos sociais beneficiados pela renda ou pela sorte, mas igualmente nas áreas menos favorecidas das regiões metropolitanas, nas comunidades da periferia, nos quilombos, nas aldeias indígenas, no cárcere.

Seu número 80, ora ofertado à fruição dos leitores, renova o gesto da Academia em favor da criação e, sobretudo, da partilha do conhecimento, sempre crítico e reflexivo, sem o qual não sobrevive o pacto democrático, do qual não se pode jamais abrir mão. O presente volume é aberto em grande estilo, com belíssimo poema de Flávia de Queiroz. Na seção dedicada à história da própria entidade, dá-se o merecido realce ao seu acervo, à correspondência de Frieiro e à trajetória da própria Revista. A parte seguinte, voltada para a lusofonia, homenageia o idioma pátrio e as iniciativas para fortalecer a sua posição na sociedade internacional, principalmente a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a CPLP, imaginada pelo gênio de José Aparecido de Oliveira, a quem se devem todas as reverências. No segmento que vem logo depois, as mais de duas dezenas de ensaios encomendados a especialistas realizam a intenção de formar fonte segura para o estudo e a pesquisa sobre a biografia e o patrimônio intelectual de várias das personalidades vinculadas à AML.

Em dossiê organizado por mim e pela brilhante professora Constância Lima Duarte, admirada em todo o país por seu rigor e por sua competência, a quem a Academia será para sempre grata, a publicação celebra a inestimável contribuição de algumas das tantas mulheres mineiras que devotaram (ou ainda devotam) a sua vida às letras. Muitas vezes vítimas da invisibilidade a que foram relegadas pelas realidades políticas e sociais ou do apagamento deliberado de seu legado, aqui elas têm a sua voz e a sua presença restauradas e reinscritas na história literária de Minas Gerais, em indispensável movimento de resgate do seu valor, fundamental para o entendimento de porção substantiva de nossa história literária.

No momento em que entrega à comunidade esta edição comemorativa da Revista, a Academia Mineira de Letras agradece a todos os que viabilizaram o seu lançamento, como: de novo e mais uma vez, Constância Lima Duarte; os seus patrocinadores; os membros do seu conselho editorial, os acadêmicos Ângelo Oswaldo de Araújo Santos, Manoel Hygino dos Santos e Wander Melo Miranda; o acadêmico Márcio Sampaio, que assina o lindo desenho da capa; a diretora-geral da AML, Maria Inês Nora Rabelo; a sua eficiente equipe, composta por Flávia de Queiroz, Guto Cortes, Marcela de
Lazari, Soraia Lara, Julia Saback, Carmen Elizabeth Moura dos Santos, Deivison Moreira e todo o aguerrido time de estagiários; e o zeloso Leonardo Mordente, profissional de primeira linha, preparador de originais, revisor e diagramador.

Que os leitores deste memorável número 80 nele encontrem o mesmo prazer de que desfrutaram os que se incumbiram de tirá-lo do mundo das especulações para fazê-lo ingressar no universo dos fatos, a despeito das dificuldades trazidas pela pandemia e por suas terríveis consequências. Que venham os próximos 80!