Subo a Rua da Bahia até chegar à Academia Mineira de Letras. Tenho horário marcado com o professor Johnny José Mafra, que, a partir de março, dará, na casa, o curso ‘Iniciação à Epopéia Clássica: uma leitura compartilhada da ‘Eneida’, de Virgílio’. O objetivo do encontro é definir aspectos operacionais: data de início, número de vagas, etc. Mesmo assim, a sessão se transforma em uma viagem pelo tempo. Johnny mostra dois livros raros de sua valiosa biblioteca, antigas traduções da obra que narra as aventuras de Enéias. Comenta alguns versos, chama a atenção para ilustrações que nem na internet estão disponíveis. Detém-se na descrição feita pelo poeta do barqueiro Caronte, que conduz as almas até o mundo dos mortos. Destaca uma das expressões usadas por Virgílio para definir o seu personagem, dono de uma ‘velhice robusta’. Reflete sobre ela. O que dá o tom do nosso diálogo é a sua fala mansa e suave, os gestos delicados, o jeito discreto, a ponderação e o equilíbrio. A paixão pelo ofício fica ainda mais visível quando conta como está preparando as aulas para os alunos, que terão o privilégio de ler trechos selecionados da ‘Eneida’ vertidos do latim para o português pelo próprio Johnny. Responsável por formar gerações de professores, mestres e doutores, ele completa, em 2017, sessenta anos de magistério. Por tudo isso, é impossível sair dessa uma hora e meia de conversa do mesmo modo como entrei.
Volto para os meus afazeres com a memória atiçada pelo contato com Johnny. Lembro-me dos professores que marcaram a minha vida. Ainda sou o menino fascinado pelas aulas da professora Miriam Brito de Castro, na quarta série primária do Colégio Sagrado Coração de Maria, até hoje instalado na majestosa sede da rua Estevão Pinto, no bairro da Serra. A disciplina se chamava ‘Comunicação e Expressão’ e tinha como objetivo iniciar os estudantes nos encantos da Língua Portuguesa e da Literatura. Exigente e rigorosa, Miriam tratava os alunos com respeito, sem as tolas concessões que os adultos costumam fazer às crianças, infantilizando-as. Sua voz era firme e sólida, e convocava o que havia de melhor em cada um. Mais tarde, já no curso ginasial do Colégio Loyola, à Avenida do Contorno, tive aulas com o professor Wellington Arruzzo Rocha, cujo compromisso com a excelência era inflexível. De humor refinado, conduzia a turma pelo mundo do conhecimento histórico de modo crítico e inteligente, apresentando a matéria em sua inteira complexidade, sem mistificações, como deve ser.
Revendo os rostos de Miriam e Wellington em minha mente, agradeço mais uma vez o quanto contribuíram para a minha formação. Além deles, naturalmente trago comigo, como referências permanentes, vários outros nomes de mestres queridos, cujas palavras foram capazes de me tocar para sempre. Quando penso em Carlos e Gabriela, meus filhos pequeninos, torço para que encontrem, pela vida afora, professores que façam seus olhos brilharem.
Por Rogério Faria Tavares, membro da AML.