Logos, que significa palavra, linguagem, discurso, é de importância absoluta na comunicação.
Tanto que o Logos próprio, individual, se torna um processo sutil que vai interferir no interlocutor.
Ele passa a sabedoria (sophia) levando a mensagem pela qual se caracteriza o comunicador.
Nem sempre se leva em conta o valor intrínseco do Logos e, assim, as palavras são muitas vezes depreciadas, sobretudo nas conversas do dia a dia.
No escritor e no orador o Logos patenteia seu desempenho, sua eficácia na arte de influenciar o interlocutor.
No fundo há sempre a intenção de persuadir e de convencer.
À técnica dialética, porém, cumpre sempre aliar a sinceridade, pois o comunicador deve estar convencido do recado escrito ou verbal.
Donde o seu modo de se expressar, empregando com finura o Logos, evitando qualquer tipo de sofisma, porque o comunicador não é, ou não deve ser um ilusionista.
Precisa passar longe da falsidade, do engodo.
É o que acontece em tantos discursos e pronunciamentos de alguns políticos que, assim, deslustram o papel do Logos.
Este não pode ser um meio de sedução, de mero fascínio, visando ludibriar.
O critério a reger o comunicador honesto é o emprego da palavra a serviço da verdade, conduzindo à sabedoria.
Há, portanto, um Logos falso e irreal que embaça o interlocutor.
O bom comunicador possui, entretanto, o desejo de exprimir a veracidade não distorcendo nunca a quididade das coisas.
Desta maneira, o comunicador se relaciona intimamente com o bem e o belo.
Há, deste modo, um Logos do sábio e o Logos do mistificador que deturpa o papel sagrado da comunicação humana.
O efeito sobre o leitor ou sobre o ouvinte daquilo que é escrito ou falado resulta de uma visão epistemológica que não pode ser superficial e depende do Logos empregado, o qual deve estar sempre a serviço da felicidade dos outros.
Isto distingue os grandes mestres da literatura como um Vieira, um Rui Barbosa, um Olavo Bilac, um Castro Alves.
É um Logos que atravessa gerações, dada sua força intrínseca.
Aí o fulgor da linguagem que sensibiliza o ser humano.
Vem da habilidade daquele que redige dentro das formas prescritas pela arte de falar e escrever.
O Logos, porém, fica assim sedimentado na sabedoria intrínseca do comunicador.
É uma palavra que não leva à desconstrução, à destruição, mas que enleva, levando às paragens do majestoso, do verídico.
As técnicas literárias se reduzem apenas a um suporte, porque o principal é a ideia, que faz do Logos seu instrumento de comunicação.
O Logos eterno
Dentro destas reflexões surge então a figura do Logos Eterno que se encarnou e legou à humanidade uma sabedoria tal que fez do Evangelho página imorredoura.
Ele é a hipóstase ou Pessoa divina que se fez carne e habitou entre nós. O Verbo Eterno do qual participa todo gênero humano.
Sob o ponto de vista literário suas Parábolas, suas imagens tiradas da natureza, suas antíteses vêm comovendo as gerações de todos os tempos.
Destaque-se a Parábola do Filho Pródigo.
O insuspeito escritor Joseph Ernest Renan afirma que esta história é uma das mais belas páginas da literatura universal.
Na opinião de muitos, razão tem o literato francês.
Esta narração feita por Cristo é de uma concisão, de um vigor, de uma movimentação descritiva incomparáveis, apresentando mensagem profunda.
Ela tem comovido os corações através dos tempos e atraído inúmeros transviados ao regaço misericordioso do Ente Supremo, cujo coração se acha sempre pronto a perdoar.
O Sermão da Montanha é uma obra-prima de comunicação apresentando um belíssimo exórdio, um desenvolvimento bem distribuído, uma peroração arrebatadora.
Esta passagem do referido texto é de uma beleza extraordinária: “Não andeis cuidadosos da vossa vida pelo que haveis de comer ou beber, nem do vosso corpo pelo que haveis de vestir; não é a vida mais que o alimento, e o corpo mais que o vestido? Olhai para as aves do céu, que não semeiam, nem ceifam, nem ajuntam em celeiros, e vosso Pai celestial as alimenta; não valeis vós muito mais do que elas? Qual de vós, por mais ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado à sua estatura? Por que andais ansiosos pelo que haveis de vestir? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham nem fiam, contudo vos digo que nem Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles. Se Deus, pois, assim veste a erva do campo, que hoje existe, e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de fé diminuta?”
Um Logos didático, pneumático, baseado unicamente na sabedoria divina. Logos do ágape, do amor transcendente e universal.
Paulo de Tarso e o Logos
O Logos teve uma conotação especial para o Apóstolo Paulo a fim de poder falar sobre o Logos de Deus encarnado em contraposição com os filósofos gregos e os judeus.
Michel Fattal escreveu um livro comentando filosoficamente detalhes da Primeira Carta aos Coríntios (1 Cor 1,17-1,16).
Dizia Paulo: ”Os judeus pedem sinal, e os gregos buscam sabedoria; Mas nós pregamos a Cristo crucificado, que é escândalo para os judeus, e loucura para os gregos”.
Como explica o citado autor, o Logos dos sofistas e dos filósofos era a linguagem do mundo e do homem, enquanto, Paulo era o anunciador de um acontecimento atinente a uma pessoa, Cristo crucificado. Este se coloca bem acima da sabedoria do mundo, aspecto que os judeus também não haviam captado e daí pedirem sinais. Paulo falava do Logos da Cruz.
Isto mostra a importância da decodificação da palavra empregada por um escritor ou orador.
Conclusões
Nunca se valoriza demais o respeito que se deve ter para com o Logos em geral, especialmente para com o Logos divino. Claras as palavras do evangelista João: ”No princípio era o Logos e Logos estava junto de Deus e o Logos era Deus […] o Logos se fez carne e habitou entre nós”. Ele foi em si o grande Comunicador da glória do Pai e Ele era a própria Verdade.
Eis porque Karl Adam pôde asseverar que “o homem e o Logos são como uma pergunta e uma resposta, o desejo e sua realização. Quem acha neste Verbo Divino a resposta à sua pergunta e a realização de seu desejo, está salvo”. Ele é o ícone da glória e da ventura completa.
O ser racional tem a dita de poder se comunicar através da palavra e captar sua força significativa é poder levar aos outros mensagens que conduzam ao Belo e à Veracidade.
Tantos textos se revelam vazios, inconsistentes, incongruentes exatamente pela displicência em empregar bem uma linguagem expressiva.
O Logos fortalece uma argumentação persuasiva e nada mais deleitoso do que ler um escritor primoroso ou escutar um orador que conduz o leitor ou o ouvinte a uma meta prefixada com clarividência.
Bibliografia
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BORN, a. Van Den. Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Petrópolis, Editora Vozes, 1977.
DECOUT, A. Persuader par la Parole. Paris, Editions Spes, 1950.
FATTAL, Michel. Paul de Tarse et le Logos. Paris, L`Harmattan, 2914.
Por Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos. Da Academia Mineira de Letras, ocupa a cadeira 12. Texto publicado na Revista da Academia Mineira de Letras | ANO 93º – Volume LXX – 2015