Com a missão de promover a Literatura e a Língua Portuguesa, a Academia Mineira de Letras (AML) foi fundada em Juiz de Fora, em solenidade na Sala de Sessões da Câmara Municipal daquele município, em 25 de dezembro de 1909, por um grupo de doze intelectuais: Albino Esteves, Amanajós de Araújo, Belmiro Braga, Brant Horta, Dilermando Cruz, Francisco Lins, Heitor Guimarães, José Rangel, Lindolpho Gomes, Luís de Oliveira, Machado Sobrinho e Eduardo de Menezes, que foi o seu primeiro presidente. A eles, depois se uniram outros dezoito integrantes e, no dia 13 de maio de 1910, data de sua efetiva instalação, os últimos dez, chegando ao total de quarenta membros, típico de instituições de tal natureza.
Antes dela, ainda em 20 de dezembro de 1896, e também em Juiz de Fora, conforme registram os historiadores e a imprensa da época, criava-se a Confraria Literária Mineira, que chegou a realizar várias reuniões, sob a presidência do jornalista Silva Tavares, em diretoria de que igualmente faziam parte Lindolpho Gomes e Thiago Guimarães. De curta duração, do referido grêmio saíram vários dos que, posteriormente, figuraram como fundadores da Academia Mineira de Letras. Inspirada pelo movimento que se espalhava pelo país e que resultaria na fundação da Academia Brasileira de Letras, em 1897, por Machado de Assis, Joaquim Nabuco e Lúcio de Mendonça, a Confraria já pregava a necessidade da união dos escritores para fortalecer a Literatura no Brasil.
Transferida para Belo Horizonte, a AML realizou sua primeira sessão na capital no dia 24 de janeiro de 1915, no Teatro Municipal. Sete anos depois, na presidência de Mário de Lima, começou a editar a sua Revista, que circula até hoje, sempre incluindo ensaios, crônicas e poemas. Por muito tempo, realizou seus encontros e suas atividades em diferentes espaços da cidade, sem pouso definido. O fim da ‘vida nômade’ só viria no final da década de quarenta, na presidência de Heli Menegale, quando fixou o seu local de funcionamento em um imóvel à Rua Carijós, 150, no centro da cidade. Em 1987, conquistou a tão sonhada ‘sede ao rés-do-chão’, fruto da tenacidade de Vivaldi Moreira, seu presidente entre 1975 e 2001: o Palacete Borges da Costa, localizado à Rua da Bahia, 1446. Em 1994, ficou pronto o prédio anexo, projetado pelo arquiteto Gustavo Penna para abrigar o auditório e um espaço para exposições de arte e lançamentos de livros. Um ano antes, era instituída oficialmente a Universidade Livre, instância promotora das atividades culturais da AML até hoje em plena atividade, sob o reitorado do acadêmico Luís Giffoni.
Detentora de um acervo de mais de trinta e cinco mil itens, entre livros raros, documentos e manuscritos, a Casa de Alphonsus de Guimaraens guarda as bibliotecas de Eduardo Borges de Costa, Nelson de Sena, Milton Campos, Eduardo Frieiro, Vivaldi e Edison Moreira, Carlos Soares de Moura, José Guimarães Alves e Onofre de Freitas, ao lado de sua valiosa drummondiana, doada por Furnas Centrais Elétricas em 2004: uma reunião de quatrocentas crônicas datilografadas e corrigidas a caneta pelo escritor itabirano. A Biblioteca dos Acadêmicos é outra de suas coleções, composta pela produção bibliográfica dos patronos, fundadores e dos sucessivos ocupantes de suas cadeiras, entre os quais Afonso Arinos, Agripa Vasconcelos, Avelino Fóscolo, Bartolomeu Campos de Queirós, Benito Barreto, Cyro dos Anjos, Guilhermino César, João Alphonsus, Olavo Romano e Rui Mourão. Conectada ao banco de dados do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas, a sua base está aberta à ampla consulta, auxiliando estudiosos e especialistas nas mais variadas investigações sobre a história cultural de Minas.
Espaço de sociabilidade e de convivência em torno do pensamento, das letras e das artes, a Academia filiou-se ao modelo francês, acolhendo não só poetas e prosadores, como também cientistas, juristas, filósofos e estadistas, de que são exemplos os presidentes Juscelino Kubitscheck, Pedro Aleixo e Tancredo Neves. Sensível à causa da Educação, o grêmio privilegia, ainda, a inclusão, entre seus membros, de professores das mais distintas matérias, como são os casos, entre inúmeros outros, de Abgar Renault, Amilcar Martins Filho, Angelo Machado, Arthur Versiani Veloso, Ayres da Mata Machado Filho, Bonifácio Andrada, Caio Boschi, Edgar de Godói da Mata Machado, Fábio Lucas, Francisco Magalhães Gomes, Hilton Rocha, Jacyntho Lins Brandão, José Carlos Brandi Aleixo, José Henrique Santos, Jota Dangelo, Oscar Dias Correa, Oscar Mendes, Patrus Ananias, Wander Melo Miranda e Wilton Cardoso. A primeira mulher a eleger-se para seus quadros foi Henriqueta Lisboa, em 1963. A ela juntaram-se, ao longo dos anos, Alaíde Lisboa, Carmen Schneider Guimarães, Elizabeth Rennó, Lacyr Schettino, Maria José de Queiroz e Yeda Prates Bernis.
Atenta à complexidade do fenômeno literário nos dias que correm, a AML define sua programação cultural prestigiando a diversidade e a riqueza das manifestações hodiernas, sem restrições de qualquer natureza, em atitude que favorece o diálogo inteligente e maduro entre a tradição e a contemporaneidade. Ciente de que a literatura não é acontecimento restrito aos gabinetes ou a certos extratos da população, beneficiados pela renda e pela sorte, seu calendário acolhe eventos que focalizam desde as expressões literárias indígenas ou afro-descendentes até as denominadas literaturas marginais, cada vez mais importantes para a compreensão do cotidiano dos grandes núcleos urbanos brasileiros – gesto inclusivo e democrático, compatível com uma visão cosmopolita e abrangente, à altura da grandeza de Minas Gerais.
Ao completar onze décadas de existência integralmente sintonizada com o seu tempo, a Academia não para: lança, agora, o número 79 de sua Revista, volume de cerca de quinhentas páginas e mais de cinquenta textos, nas versões eletrônica e impressa, em caprichada edição, capa do acadêmico Carlos Bracher e apoio da Assembleia Legislativa, sempre consciente da importância da instituição para a vida cultural do estado; celebra o sucesso de seu site na Internet (www. academiamineiradeletras.org.br) e a ampliação de sua repercussão em redes sociais como o Instagram, o Facebook e o Youtube, onde oferece uma aula inédita toda semana, além do acesso gratuito a mais de duzentos vídeos exclusivos; comemora a ampla receptividade da AML Cursos, sua plataforma virtual de oficinas de formação, canal para que o conhecimento, a reflexão e a crítica cheguem a centenas de pessoas; e publica “20 contos sobre a Pandemia de 2020”, em parceria com a Editora Autêntica. Prova de seu apreço pela ficção mineira, a coletânea é fruto do empenho da agremiação em gerar ‘documentos literários’ que possam amparar pesquisas futuras, além de instrumento para atrair o interesse das novas gerações e reforçar a presença do livro na paisagem urbana.
No momento em que esta edição histórica do Suplemento Literário celebra os trezentos anos de Minas Gerais, nada melhor que renovar a crença no poder da literatura como fundamental para o avanço da inteligência contra a ignorância e da civilização contra a barbárie. É o que a Academia Mineira de Letras tem feito, desde o seu nascimento, e é o que a anima a seguir em frente, entusiasmada e altiva, leal aos princípios e valores que animaram seus idealizadores, há cento e onze anos.
Texto publicado na “Edição Especial do Suplemento Literário de Minas Gerais” de Novembro de 2020.