O escritor Franklin Jorge presta um relevante serviço ao país que lê ao selecionar textos de Luís da Câmara Cascudo no volume “Actas Diurnas”, que acaba de ser publicado em Natal (RN) por Adriano de Souza, sob patrocínio do Novo Jornal e do Instituto Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo, presidido por Ana Maria Cascudo Barreto, presidente.
Neste tempo que atravessamos, em que se fala do Estado nordestino por atos de violência ali praticados, com ênfase na rebelião ou rebeliões no presídio de Mossoró, é de suma importância saber-se que naquele pedaço de Brasil, tão visitado por suas bela praias, há mais, muito mais. Para lembrar, por exemplo, a produção intelectual e literária de Cascudo, representante das mais belas tradições da terra e de sua gente. Ana Maria e o jornalista Cassiano Arruda Câmara, este de “O Novo Jornal”, honram, assim, o compromisso de preservar, divulgar e gerenciar o patrimônio cultural de quem fala tão alto entre os potiguares.
O Rio Grande do Norte tem gloriosa história, a começar porque os portugueses apareceram por lá, com dom Nuno Manoel, em 1501, um ano após descoberta a terra. Mas não só os lusos se interessavam por ela e a ocuparam. Os franceses lhes seguiram os passos. Só em março de 1597, um ataque simultâneo por terra e mar, expulsou os súditos de Paris, naquela que é considerada entre as mais importantes operações de guerra do Brasil colonial. Foi a retomada do território, verdadeiro marco no controle do Nordeste, como registra Ivan Alves Filho. Terminava ali a ocupação francesa, nas proximidades da fortaleza dos Reis Magos, como conta o jesuíta Serafim Leite.
Muita história, pesquisada e relatada, inclusive pela voz popular, exatamente por Câmara Cascudo, que precisa ser mais difundido. Não se esquecerá das lutas históricas que lá tiveram lugar, como a rebelião comunista de 1935, a Intentona, que chegou a instalar um governo provisório em Natal.
Tudo isso de que eu falo passou por Cascudo, que focalizou a história dos Santos Reis do Oriente, considerando-a como uma vitória da tradição oral, da cultura popular, sobre a secura dos textos religiosos. O historiador sentencia: “foi uma veneração que o povo soube levar até o culto e derramá-la pelo universo cristão”.
De fato, dos evangelistas apenas Mateus foca o assunto, enquanto Marcos, Lucas e João guardam silêncio, sendo conveniente observar que mesmo o único a registrar o fato nada diz sobre a individualização dos visitantes à manjedoura onde nascera o filho de Deus. Revelou simplesmente: “Eis que uns magos vieram do Oriente”, não dizendo quem era e quais seus nomes, a cor da pele. E olhe que a visita já estava profetizada nos Salmos de David e de Salomão e em Isaías.
Pois Cascudo comenta: “os cristãos simpatizaram com aqueles homens que tinham vindo de longe procurando o Rei dos Judeus, guiados pelo clarão de uma estrela miraculosa, a nossa Estrela do Natal, que está no escudo da nossa cidade que usa o divino nome”.
Os três sábios não mais intervieram em nada na vida terrena de Jesus, mas Cascudo realça que São Tomé ainda os encontrou vivos e velhinhos e lhes concedeu as águas do batismo, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Há muitas razões, pois, para elogiar o esforço de Franklin Jorge, do Ludovicus, de O Novo Jornal. Cascudo é um patrimônio.
Por Manoel Hygino dos Santos, 1° tesoureiro da Academia Mineira de Letras, ocupa a cadeira nº 23