Repetiu-se a tragédia de Galdino, morto na capital nacional, há alguns anos, perto de uma parada de coletivos. Rapazes de famílias beneficiadas por posição social atacaram o índio sem qualquer motivo, agrediram-no até perder a vida e atearam fogo ao corpo.
No dia inaugural do ano 2018, no litoral de Santa Catarina, que já teve na presidência um mineiro de Montes Claros, o índio Marcondes Namblá foi agredido a pauladas até a morte, no balneário de Penha. A vítima tinha 38 anos, era da etnia Laklâno e seguira o itinerário que os brancos civilizados indicam para tornar-se um cidadão brasileiro, digno, útil à pátria.
Professor formado pela Universidade Federal de Santa Catarina, chegou a ser transportado a um hospital, mas “não resistiu”, com dizem os repórteres de televisão e rádio. Uma câmera de monitoramento, que documenta fatos mas não os evita, filmou o episódio. A agressão foi praticada por um homem, acompanhado de um cachorro. A Polícia Civil investiga a hipótese de crime motivado por ódio racial.
Logo o Brasil, abençoado por Deus! A Funai e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), admitem que o homicídio tem a ver com intolerância. Namblá fazia parte de um grupo de 12 índios de aldeia na terra Laklâno, no município de José Boiteaux.
Algumas linhas de um raro jornal que publicou a notícia esclarecem: aproxima-se um homem, portando um pedaço de madeira. Eles conversam rapidamente, quando o civilizado dá-lhe um golpe na cabeça. Não há reação. A vítima recua e volta a ser atingida, cai no chão e os ataques seguem. Ao perceber que Marcondes tenta levantar-se, ataca-o novamente. É a crônica de um homicídio de começo de ano.
Pedestres encontram o índio por volta das 5h. Tinha um sangramento na cabeça e foi atendido pelo serviço de resgate do Corpo de Bombeiros. Levado a uma unidade de pronto-atendimento, em razão do estado grave, foi encaminhado ao Hospital Marieta Kondor Bornhausen, em Itajaí.
Morreu às 20h de terça-feira. O delegado Douglas Teixeira Barroco, da Polícia Civil de Piçarras, se disse chocado ao ver as imagens. “Ele foi massacrado sem piedade. Já temos a identidade do possível agressor e esperamos encerrar a investigação a qualquer momento, inclusive para saber o motivo de um crime tão brutal”, disse.
Casado e pai de cinco filhos, Marcondes ensinava a língua em sua aldeia, uma das oito da terra. Formado em licenciatura intercultural indígena da Mata Atlântica, estava inscrito para doutorado.
De acordo com uma parceira de trabalho, Janaína Hubner, o colega era religioso e não bebia. Saiu sozinho para ver a queima de fogos pela passagem de ano na orla, mas não retornou.
Apenas mais um índio morto. Mais um registro, não fantástico, de violência e dor. A família sentirá, porque os índios aprenderam a palavra saudade. Mas também revolta.
Por Manoel Hygino dos Santos, 1° tesoureiro da Academia Mineira de Letras, ocupa a cadeira nº 23