Assassinado em 1940, na cidade do México, por ordem de Stalin, Trotsky aparece agora nas telas da televisão russa, como comentado por Vitor Gomes Pinto. Em oito capítulos, revive-se a história de um dos mais importantes personagens do século XX, relatada pelo Pervie Canal, o Canal 1, para todo o território. Como se deve esperar, atraindo público inédito, dada a restrição- a palavra é fraca- que se fazia até hoje à personalidade focalizada e seu trágico fim.
A série foi anunciada por imagens pela própria Pervie Kanal, como já se se avisara durante o Mipcon, projeto voltado para o mercado internacional de conteúdos audiovisuais, realizado em Cannes. O fato passou a ocupar amplos espaços na mídia mundial e Konstantin Ernst, diretor-geral da rede, com 51% das ações do governo, explicou porque: “É a primeira série dedicada a Trotsky na história da Rússia. Ao contrário de Lênin, Trotsky se parecia com um herói de rock: fuga da prisão, revolução, amor, exílio e morte”. Todo mundo, por suposto, sabe algo a respeito.
Há cerca de dois meses, comentei aqui a repito: Leon Trotsky foi um dos principais instigadores, junto com Lênin, da Revolução de Outubro de 1917, que inspirou até um poema veemente de nosso Drummond. Fundador do Exército Vermelho, consagrou-se como um dos artífices do primeiro plano da vitória dos bolchevistas na guerra civil russa de 1918-1921.
Estabelecido o novo governo após Kerenski, Trotsky se opôs a Stalin, expulso do governo e do partido e, em seguida, da União Soviética. Passou pela Turquia e Noruega e, por fim, se transferiu para a América Central, escondendo-se na casa do pintor Diego Rivera, na capital mexicana. Conseguiu escapar de um primeiro atentado ordenado sistematicamente por Moscou, mas não do segundo, em 20 de agosto de 1940, na rua Coyacán, no distrito central da cidade.
A cena do último ato já foi focalizado pelo cinema inúmeras vezes. Agora, interpretado pelo popular ator russo, Konstantin Khabenski, aparece um homem envelhecido, que conversa com um jornalista canadense. Este representa o espião espanhol Ramón Mercader, enviado especificamente ao novo mundo para eliminá-lo. À polícia, ele contou: “Fechei os olhos. Desfechei um golpe terrível na cabeça de Trotsky. O grito que ele deu, eu jamais esquecerei. “Um “ah” longo e sem-fim, um som que ainda ecoa em meu cérebro. Trotsky ainda se levantou, correu em minha direção e mordeu minha mão. Consegui empurrá-lo. Caiu, mas se levantou de novo”.
Em Moscou, Pavel Sudoplatov, dirigente da KGB, que recebera pessoalmente de Stalin a ordem para a Operação, ouviu- através de mensagem de rádio cifrada – a confirmação do sucesso da empreitada. O “camarada” Trotsky estava definitivamente fora de combate.
Há alguns anos, o jornalista Geneton Moraes Neto entrevistou-o. Sudaplatov falou com frieza impressionante. Não há lugar para arrependimentos tardios ou sentimentos “vãos numa operação planejada e perpetrada em nome do Estado”.
A real identidade do assassino só foi obtida anos depois. Suportou sessões de tortura duas vezes por dia pela polícia mexicana. Mais tarde, ganhou do Kremlin uma casa de campo próxima a Moscou e uma pensão equivalente à de um major-general. Chegou a trabalhar para o governo Fidel Castro, no Ministério do Interior cubano, até morrer, em Havana, em 1944.
Por Manoel Hygino dos Santos, 1° tesoureiro da Academia Mineira de Letras, ocupa a cadeira nº 23