Na escola primária, ouvi o conto daquele aluno que devolvera o “dever de casa” com numerosos e graves erros. A professora, experimentada na diária lida com seus infantes, perguntou se ele fizera o trabalho sozinho ou se alguém o ajudara. Embora receoso, explicou à distinta mestra que seus pais o tinham auxiliado na missão. A professora observou, incontinenti: “Bem que eu desconfiava. Não seria possível apenas a uma pessoa cometer tantos e tão sérios erros”.

A historieta se presta ao Brasil de hoje. Não se trata de crise criada por uma única autoridade, sequer por um só grupo de pessoas, por um partido político. Os fatos equívocos, suspeitos ou flagrados, os desvios, as ilicitudes, os escândalos são tantos e tão escabrosos, que não resultam de ações solitárias, embora estes casos possam existir. É perfeitamente admissível que, aproveitando as circunstâncias favoráveis, inclusive a possível impunidade por seus atos, alguém se disponha a também enfiar a mão na cumbuca com objetivos escusos.

A impunidade produz exemplos e gera adeptos. E como tem sido perniciosa à vida nacional! O grande desencanto e a decepção resultam da falta de expectativas concretas com relação ao futuro do país, aquele previsto por Stefan Zweig, que, cônscio das grandes potencialidades nacionais e de perspectivas saudáveis, confiava em que seríamos uma grande nação. O Brasil, de fato, cresceu muito, principalmente em problemas e no número daqueles que se enriquecem com o dinheiro desviado dos cofres públicos, de obras pagas, mas não realizadas, dos superfaturamentos de empreendimentos de todas as dimensões, em todos os rincões e em todas as áreas de atuação oficial.

Mudam-se os nomes dos que assinam os atos oficiais, mas permanecem as suspeições, as investigações, as condenações e prisões, seguidas da libertação permitidas pela legislação por falhas nas respectivas disposições.

Deles se servem competentes escritórios de advocacia, que defendem causas indefensáveis, porque escusas e em detrimento do interesse superior da nação, do cidadão, das instituições.

Repito aqui trechos de artigo de Fernando Gabeira, em março do ano passado, com o título “É o fim do caminho”: Na semana passada escrevi, “O processo de morrer”. Não tenho mais saída exceto apelar para “O livro tibetano dos mortos”, que dá conselhos aos que já não estão entre nós. O conselho é seguir em frente, não se apegar, não ficar rondando o mundo que deixam.

Simplesmente não dá para continuar neste pesadelo de um país em crise, epidemia de zika, desemprego, desastres ambientais, é preciso desatar o nó, encontrar um governo provisório que nos leve a 2018.

De todas as frentes da crise, a que mais depende da vontade das pessoas é a política. Se o Congresso apoiado por um movimento popular não resolver, o TSE acabará resolvendo. Com isso que está aí o Brasil chegará a 2018 como um caco, não só pela exaustão material, mas também por não ter punido um governo que se elegeu com dinheiro da Petrobras.

É hora de o país pegar o impulso da lava-jato: carro limpo, governo derrubado, de novo na estrada. É uma estrada dura, contenções, recuperação de credibilidade, quebradeira nos estados e cidades. É pau, é pedra, é o fim do caminho”.

 

Por Manoel Hygino dos Santos, 1° tesoureiro da Academia Mineira de Letras, ocupa a cadeira nº 23.