As hegemonias, como as unanimidades, são burras. E míopes.

Burras porque, para se perpetuarem, abusam das armas disponíveis para eliminar pontos de vista ou culturas diferentes. Às vezes, até admitem alguma influência externa ou de grupo minoritário, desde que possam absorvê-la sem se comprometer. As hegemonias assumem o papel de gendarmes do bem, reservando o papel do demônio às vozes dissonantes. Julgam-se paladinas da justiça e a distribuem de acordo com o interesse e a conveniência da hora, sem se importar com a coerência de seus atos.

Como tudo que é humano, as hegemonias um dia terminam. As mais perigosas são justamente as mais bem sucedidas, aquelas que se impuseram de modo mais amplo. Quando desabam, e sempre acabam desabando, deixam um vazio de opções e, em seu rastro, a desorientação ou o caos. Após a queda do Império Romano, sucederam-se mil anos de estagnação, conhecidos por Idade das Trevas, em que o mundo ocidental viveu um misticismo desastroso e as fogueiras queimaram algumas das melhores cabeças. A civilização reencontrou o caminho em boa parte graças aos muçulmanos que recuperaram, reproduziram e reintroduziram na Europa textos oriundos das antigas Grécia e Roma banidos pelos cristãos hegemônicos. Surgiu então o Renascimento.

As hegemonias são míopes, porque não enxergam um metro além do quintal. Acreditam que a vida de um de seus cidadãos equivale à de dez dos estrangeiros – ou mil, como se depreende dos discursos mais inflamados. Condenam o assassinato de seus próprios inocentes, porém matam inocentes alhures e, com cinismo, propalam que distribuem a morte com justiça. Se entendem que seus interesses foram contrariados, ameaçam meio mundo com a vingança e o dies irae. Ignoram decisões de fóruns mundiais que desagradam seus aliados, porém efetivam a toque de caixa as que atingem os desafetos. Quem não está a favor está contra: de que prática democrática extraíram tamanha arrogância?

 

Por Luís Ângelo da Silva Giffoni, ocupante da cadeira nº 33  da Academia Mineira de Letras.