A arquitetura e a escultura do Aleijadinho, a pintura de Ataíde, a poesia e o teatro de Cláudio Manuel da Costa e a música de Lobo de Mesquita completam-se na dimensão ética e política da Inconfidência. A etimologia diz que política, em grego, é a arte de governar a cidade.
E a primeira constelação de cidades vista no território brasileiro, configurada pelas vilas e arraiais da Capitania das Minas, proporcionou a formação de uma consciência cidadã, o compartilhamento da ideia de autonomia e a vontade política que embasaram a conjura de 1789. Tiradentes foi punido com a forca, o esquartejamento e a difamação da memória em 1792, 30 anos antes de ter seu sonho concretizado pelo herdeiro do trono de Lisboa.
Minas resistiu aos impostos, à Inquisição e à escravidão
Sendo a capitania mais populosa e mais rica da América portuguesa, Minas Gerais exerceu um protagonismo decisivo na construção da independência. A resistência aos tributos e às interdições régias, como a proibição da tecelagem, o enfrentamento da Inquisição e a lição libertária dos quilombos retemperaram o ânimo dos mineiros.
As “pérfidas ideias francesas” do Iluminismo e da Revolução, trazidas pelos filhos da terra que estudaram na Europa, alimentaram a insatisfação provocada pelos abusos do fisco e dos sucessivos governos, culminando com o de Luís da Cunha Menezes (1784-1788), o “Fanfarrão Minésio” satirizado pelo poeta Tomás Gonzaga nas “Cartas Chilenas”.
O príncipe regente dom Pedro reconheceu a importância estratégica de Minas, ao visitar a província, em abril de 1822, a fim de sondar o espírito dos mineiros a respeito do caminho a seguir. Pressionado pelas Cortes de Lisboa, que subjugaram a autoridade de dom João VI e pretendiam reduzir o Reino Unido do Brasil à condição de colônia, ele buscou a empatia e a solidariedade de Minas.
Foi recebido festivamente em São João del-Rei, Barbacena e Ouro Preto, anunciando que a libertação estava próxima – ainda que tardasse por mais 66 anos para milhares de escravizados. Ao tornar-se imperador, um de seus atos inaugurais, em 1823, seria elevar Vila Rica a Imperial Cidade de Ouro Preto, como reconhecimento do papel dos mineiros na independência.
Mineiro mostrou ao Imperador que não havia alternativa à Independência
Entre os interlocutores do príncipe estava o padre Belchior Pinheiro de Oliveira. Nascido em Diamantina e titular da paróquia de Pitangui, ele integrava a comitiva de dom Pedro na viagem entre Santos e São Paulo. No momento em foram lidas as cartas de Dona Leopoldina e José Bonifácio, disse ao regente que não havia outra saída que a imediata declaração de independência.
Coube ao padre Belchior representar o sentimento de Minas e o desejo dos mineiros desde as conspirações tramadas nos idos de 1788 e 1789. Por sua palavra incisiva, ali mesmo, junto ao ribeirão onde o príncipe acabara de se aliviar de uma indigestão, começou a etapa histórica que hoje completa dois séculos de turbulenta caminhada, em meio às esperanças sempre renovadas diante de indigestos acontecimentos.